
Quando a mensagem e a interpretação conseguem salvar o filme do marasmo irritante.
Dando uma rodada nas opções da Netflix (quem nunca cansou de fazer isso, né?), me deparei com um aparente Faroeste e estrelado por Benedict Cumberbatch, o nosso querido Dr. Estranho. Pensei ter encontrado uma boa opção. Quando me informei a respeito, vi que o longa vem forte para o Oscar, já pensei 2x. Apesar de ser o símbolo “maior” de premiação do cinema, tenho muito pé atrás. Com exceção a Rocky, Coração Valente, Gladiador e Senhor dos Anéis, poucas vezes vi filmes bons premiados, então não sou muito favorável. Enfim, resolvi testar, será que me surpreendi? Mais ou menos!
O filme conta a história de Phil (Cumberbatch) e George (Jesse Plemons), irmãos que comandam juntos um rancho familiar que receberam como herança. Vivendo nos anos 20, o que já deixa o Faroeste um tanto de lado, mas não para o primeiro que é um patrão tirânico, respeitado pelos funcionários. Já o segundo tem um temperamento dócil, sendo ignorado pelos pastores e caubóis. Quando George se casa com Rose (Kirsten Dunst), uma viúva cujo filho adolescente é considerado efeminado demais para os padrões locais, Phil faz questão de deixar claro que os dois não são bem-vindos na propriedade. Começa uma batalha silenciosa e feroz pelo poder.
Com um começo lento até demais, confesso que em muitos momentos pensei em mudar de opção ou mesmo desligar e ir dormir, mas algo ainda me prendia a tela, e era a interpretação de Cumberbatch. Com muita entrega em seu personagem “super macho perturbado”, o ator se consolida como um grande nome em Hollywood, desde o Mago Supremo (ou ex), passando por Sherlock e agora em Ataque de Cães. E carrega o piano sozinho, já que o restante do elenco claramente não consegue chegar ao mesmo nível de atuação, salvo momentos em que Peter (Kodi Smit-McPhee) ajuda em cena.
Além da excelente interpretação, o filme esconde como seu maior trunfo a mensagem. Claro que todo longa tem a sua, mas aqui não é apenas uma e pode até passar desapercebida aos menos atentos. Se entrarmos no que psicologicamente podemos extrair da trama, nos deparamos com várias questões. Complexo de Édipo (não literalmente), proteção, depressão, alcoolismo e, principalmente, falta de aceitação.
Obviamente pensamos no tema da homossexualidade, exposta em Pete e na revelação ao desenrolar da história, mas aí que nos enganamos. O filme não se baseia apenas no tema em si, mas em todas as “máscaras” não reveladas. O quanto o ser humano se disfarça em outra vida ou realidade para camuflar a que realmente vive, criando inclusive um ódio sobre o averso. Profissional, afetiva, íntima, familiar, marital ou mesmo comportamental. Quanto o meio que se habita comanda o ser. A mensagem aqui é pesada, carregada e não pontual, tornando sua existência muito mais importante do que seu contexto cinematográfico.
Se por um lado a importância do longa e seu ator principal seguram as pontas, a maneira arrastada da direção cansa e muito. Jane Campion manda bem nas tomadas de expressões e peso nos diálogos, mas se perde com a morosidade da condução da história e, principalmente, em muitos momentos “de devaneios” com takes loooongos em montanhas, céus, pássaros e até mesmo, pasmem, em moscas (isso mesmo, chega a irritar!) te fazendo perguntar, “Pra que isso?”.
A parte disso, fica a certeza que um filme de Oscar (certeza será um dos indicados) precisa mais do que roteiro polêmico e grande interpretação. Precisa além disso, de uma boa condução e ritmo, fazendo com que mais pessoas sintam vontade de continuar assistindo e despertem interesse. Claro que tudo tem seu público, mas porque não tentar expandi-lo?
Ataque dos Cães, não é para qualquer um. É um filme que te testa, levando ao extremo da paciência, mas que ao final te faz pensar que valeu a pena o tédio. A mensagem forte e o desfecho que requer olhar muito atento, inclusive para desvendar o nome do longa, aliado a interpretação perfeita de Cumberbatch, o fazem merecedor de prêmios e discussões.
ATAQUE DOS CÃES
Direção: Jane Campion
Netflix
Elenco: Benedict Cumberbatch, Jesse Plemons, Kodi Smit-McPhee e Kirsten Dunst
Nota: 7.5/10