
Saiu na Prime Video mais uma minissérie histórica, recheada de conteúdo e boas discussões. Já analisamos aqui as narrativas de Hernán e El Cid, agora trazemos uma que lembra os tempos de escola: Sem Limites. Narra a viagem de Fernão de Magalhães e Juan Sebastián Elcano que abriram uma nova rota das especiarias e de quebra a primeira volta ao mundo pela navegação.
Fica a dica do Kapoow para os professores de História e Geografia, pois temos aqui uma excelente fotografia, figurino e maquiagem em trechos gravados entre a Espanha e a República Dominicana. Cada episódio é praticamente um dos grandes pontos desta viagem que demorou quase três anos para terminar. São seis capítulos entre 50 e 38min cada, muito pouco para o grande feito dos navegadores. Mesmo isto ou o CGI as vezes aparente, não tiram o brilho da produção e a valorização da história.
Nomes de peso como Rodrigo Santoro (interpretando o navegador português) e Álvaro Morte (Elcano, o espanhol) tem a direção de Simon West, responsável por nada mais nada menos que filmes como “Lara Croft: Tomb Raider”, “O Resgate” e “Os Mercenários 2”.
As
O brasileiro traz uma citação que resume muito de sua excelente interpretação junto com outros atores que se entregam aos personagens e à história: “Antes, só lembrava que ele havia sido um navegador. Mas aí decidi explorar a intimidade de quem foi esse homem e li até demais. Li tudo o que existe na internet, de discussões de filósofos a reconstituições de expedições, assim como duas biografias e muito sobre o contexto da época. Eu queria entrar na cabeça de um homem de 1500”.
O cara entrou tanto no personagem que arrumou briga para que seu personagem tivesse falas em português de Portugal, bem como o espanhol no idioma original. Vale a pena assistir legendado, apesar de que em minha TV a descrição estava atrasada e o aplicativo não tinha configuração disponível.
Fonte: https://www.infoescola.com/historia/volta-ao-mundo-de-fernao-de-magalhaes/
Vem textão abaixo, não é spoiler pois a história se passa a 500 anos atrás, mas achei necessário apresentar as curiosidades reais que a minissérie narra ou que ficaram como pano de fundo.
Iniciamos conhecendo os planos de Magalhães chegar mais rapidamente às Ilhas das Especiarias por outra rota, mas é ignorado pela Coroa Portuguesa, que já dominava o único caminho conhecido até então, o Cabo da Boa Esperança, no extremo sul da África. “Vende” sua ideia para a Espanha e embarca no dia 20 de setembro de 1519, com cinco navios e 237 homens através do porto de Sanlúcar de Barrameda, em direção ao Atlântico.
O principal objetivo da viagem, combinado inclusive com o Rei, era alcançar as Ilhas Molucas (Ilhas das Especiarias), hoje conhecida como Indonésia, reivindicando as terras para a Espanha. Este foi o caminho buscado por Cristóvão Colombo, mas que “sem querer” encontrou o continente americano (existem muitas controvérsias).
A primeira parada da tripulação, apesar de não ter recebida a devida importância na série, foi no litoral do Rio de Janeiro, em dezembro de 1519. Depois daí a coisa começou a apertar: após meses pesquisando a costa leste da América do Sul, enfrentam um inverno congelante, aumentando o consumo da alimentação e gerando tumultos nos navios. Para piorar, um navio naufraga e o outro deserda, levando consigo a maior reserva de mantimentos.
Depois de meses de investigação, descobrem uma passagem para o oeste, hoje batizada de Estreito de Magalhães (Chile). No dia 28 de novembro de 1520, entram naquele que batizam de Mare Pacificum (mar pacífico). Coitados, não sabiam que paz não seria um bom termo nesta longa travessia. Não imaginavam que aquelas águas eram do dobro do tamanho do Atlântico e que cobre um terço da superfície da Terra.
Antonio Pigaffeta, um dos cronistas da tripulação assim escreveu:
“Durante três meses e vinte dias não conseguimos comida fresca. Comemos bolo, embora não fosse bolo, mas poeira misturada com minhocas e o que restava cheirava a urina de rato. Bebíamos água amarela, que estava podre, por muitos dias. Também comemos algumas peles de boi que cobriam a parte superior do pátio principal”.
Sem encontrar terra, passaram 100 dias de fome e sede, levando a morte pela doença escorbuto (falta de vitamina C), comum nas grandes navegações da época, por conta da má alimentação a bordo.
Quando encontram hoje a ilha conhecida como as Filipinas, Magalhães fica encantado com a riqueza de recursos e tenta interferir na política local para tentar tirar vantagem. O rei da ilha de Mactan se opõe e tem-se início uma guerra que leva à morte o descobridor português, nem sequer seu corpo entregue à tripulação.
Juan Sebastián Elcano se torna o novo comandante da expedição, alcançando as Ilhas das Especiarias ou Molucas, em novembro de 1521.
Se não bastasse a aventura até então, se questionam se vale a pena retornar pelo caminho de onde vieram, cumprindo o acordo com o Rei, ou seguir as teorias de Fernão, alcançando o Oceano Índico de leste a oeste.
O navio Trinidad, que havia sido comandado por Magalhães, tentou retornar pelo Pacífico, mas não obteve sucesso, e foi capturado por navios portugueses. O Victoria, com Elcano à frente, teve sucesso ao arriscar o novo caminho, mas tiveram de parar em Cabo Verde por conta das péssimas condições da viagem. Mesmo tentando mentir o intuito da viagem, os portugueses desconfiaram e capturaram quase metade da tripulação, o restante fugiu.
Somente em 6 de setembro de 1522, o Victoria atracou no porto de Sanlúcar com apenas 18 tripulantes dos 250 que partiram – completando assim a primeira circunavegação no mundo da qual existem evidências. Uma jornada de 14.460 léguas (69.813 km).
Carlos 1º recebeu alguns dos sobreviventes e concedeu a Elcano uma renda anual e um brasão de armas com um globo e a legenda: Primus Circumdedisti Me (“O primeiro que me circunavegou”).
Mas porque os temperos tão comuns de hoje eram tão valiosos naquela época?
A Europa era um continente com um clima que não favorecia o cultivo de uma variedade tão grande de alimentos como se estavam descobrindo nos países tropicais. Para se ter uma ideia, nesta época o único adoçante conhecido era a beterraba!
As especiarias trariam uma revolução não só para a culinária, mas também para a fabricação de cosméticos, perfumes, óleos, medicamentos e até mesmo para a tinturaria de roupas. Um quilo de cravo-da-Índia, citado na série, tinha o mesmo valor de sete gramas de ouro. Era usado para combater a dores, infecções e muitos acreditavam em seu poder afrodisíaco. E você, assim como eu, provavelmente só o conhecia na canjica, enfeitando o tender no Natal ou os docinhos das festas dos anos 90! kkk
Outros temperos valiosos eram a pimenta-do-reino, a noz-moscada, a canela e o gengibre.
Consequências desta viagem para a história mundial:
O feito de Magalhães e Elcano abriu as portas para um novo mundo, novas rotas poderiam ser traçadas, novos povos foram descobertos, a Terra não é plana! Era o fim da mitologia medieval que pregava a existência de povos monstruosos e inacessíveis, todos eram seres humanos, apenas com culturas e modos diferentes. Claro que isto naquela época não ficou claro, e até hoje em dia temos um preconceito enorme com “o diferente”.
Retratar esta história em uma minissérie é valorizar a cultura e os grandes feitos em prol da humanidade. Sonho ainda com um tempo em que nossas séries nacionais tenham também este enfoque.
SEM LIMITES
Título original: Sin límites
Criação: Patxi Amezcua
Elenco: Rodrigo Santoro, Álvaro Morte, Sergio Peris-Mencheta
Nacionalidade: Espanha
Nota: 9,5/10
Teaser oficial: