
Quando vi o primeiro vídeo de gameplay de “Mortal Kombat X” não me empolguei. À primeira vista, via nele um misto nada inovador de “Injustice” com a mesma mecânica de sucesso do seu antecessor, o reboot de 2009. O tempo passou, e de lá pra cá, a Netherrealm tratou de mostrar novidades, como os novos lutadores, fatalities ainda mais ousados e – principalmente, um sistema de luta mais robusto. E a imagem que eu tinha dele melhorou consideravelmente. Agora, com ele em mãos, fiquei com um misto de impressões. De fato, “MKX” se apoia na mecânica de sucesso do game anterior da série e tem lá os seus cenários interativos – mesmo que mais discretos e nem tão ativos – a la “Injustice”, mas de fato, está mais maduro e menos com uma oferta de lutadores não tão atraente, está mais completo. O amadurecimento da franquia se agarra em três pilares – fotorrealismo, seriedade e robustez, que explicarei a seguir. Se é melhor que seu antecessor? Não, infelizmente não e isso nem é demérito, afinal, “MK9” foi, depois do incrível “MKII”, o melhor game da série. Mas é fato que essa décima edição representa um passo gigante para um segundo round em sua própria história. Mais robusto, mais sério e com uma mecânica mais completa, ele tenta ganhar adeptos de outras bandas que sequer pensavam em disputar uma luta com Scorpion ou Subzero em um campeonato. Potencial para essa mudança de paradigma agora o jogo da Netherrealm têm de sobra.
Fotorrealismo Desde a transição dos gráficos digitalizados (até UMK3) para o 3D poligonal de MK4, a franquia nunca se apegou ao fotorrealismo dos modelos dos lutadores. E quando teve a oportunidade de fazer isso no reboot da nona versão, a Netherrealm optou por manter a anatomia dos guerreiros exageradas, com longas pernas e braços. Até as personagens que apelavam para a sensualidade, como Kitana e Mileena, tinham suas pernas muito alongadas e cinturinhas finas – o que convenhamos, seria impossível de se ver uma lutadora fortona de verdade. Agora, os lutadores estão seriamente retratados, a anatomia humana foi respeitada e os modelos estão mais realistas. Os rostos, como o de Scorpion em sua figura humana ou da heroína Cassie Cage transmitem um sensação de realismo que antes não existia, com feições bem definidas e que transmitem a emoção e dramaticidade que as cenas – principalmente no modo história – exigem.
Da mesma forma, a reação das alterações climáticas do cenário com os corpos dos ‘kombatentes’ também são incríveis: a chuva forte respinga com peso no ombro dos lutadores, ao passo que os flocos de neve caem varagosamente e se movimentam com o vento. No final da luta, em ceários chuvosos, as gotas podem ser vistas na testa ou espirrando no pescoço deles. E, como já é tradição na série, fim de luta remete a fatalities. E esses movimentos estão bem violentos. Em um dos mais impressionantes, Scorpion solta uma bola de fogo que estoura a barriga do oponente, deixando o coração à mostra. Em seguida, o ninja usa sua espada para fatiar a cabeça do inimigo, que fica sem face e com seu cérebro e línguas cortadas. Da mesma forma, os golpes de raio-x estão ainda mais impressionantes e impactantes.
Mais sério, menos sexista. O que mudou, para a tristeza de alguns foi o sexismo exagerado e desnecessário. Não há mais danos nas roupas, ou seja, esqueça aquela barra forçada de ver os seios da Mileena quase a mostra após tanto levar porrada. Aliás, pouco importava se ela levasse apenas chutes e socos na cara, antes a roupa rasgaria completamente. Agora, o sangue marca a surra dos lutadores em desvantagem na luta e até alguns hematomas podem ser vistos, mas em menor quantidade. É um passo incrível para o amadurecimento da série. Da mesma forma, as roupas estão bem mais discretas. Vamos combinar: está na hora de mudar algumas coisas na indústria de games e a ideia de que lutadora de jogo de luta precisa mostrar a bunda pode até agradar alguns, mas ofende justamente quem mais poderia se interessar em escolhê-la, que é o público feminino. Agora, Kitana até mostra as pernocas, mas suas roupas são mais discretas, de bom gosto e mais conectadas com a trama. Ela é uma princesa-guerreira e se veste como tal. Sonya Blade, já mãe de família e de alta patente no exército, tem uma roupa de soldado, assim como Cassie e Jacqui Briggs. Menos bunda, mais respeito, mais amadurecimento. É um bom passo e sinal de ousadia da Netherrealm em mudar o conceito. Parabéns aos envolvidos.
Mais robusto, mais competitivo Sabe aquelas táticas da mecânica do “MK9”que remetiam aos seus antecessores e que muita gente repetia freneticamente nas lutas? EM “MKX”esses lutadores saudosistas vão dançar. Acabou a farra. Agora, cada lutador tem três estilos de luta, o que nem chega a ser surpresa na série, pois já apresentou mudança de estilos com armas na época do PS2, mas agora, tudo está mais robusto. Por exemplo, antes de escolher Scorpion saiba que o estilo mais focado na espada mudará drasticamente a forma como ele se comporta na arena. Gosta de mais pirotecnia e menos combos? Opte pela versão mais demoníaca do cara, que abusa dos golpes flamejantes. Alguns golpes mudaram os comandos, até pela enorme quantidade de movimentos novos, mas no final da scontas, o que era bom ainda está lá, com algumas modificações aqui e ali, mas tudo minuciosamente pensado para equilibrar o multiplayer. E é no multiplayer que “MKX”mostra seu verdadeiro valor. As lutas estão mais competitivas, com disputas eletrizantes, golpes violentos e combos incríveis. Se desse para compará-lo a algum clássico da série, diria que ele está mais para “Ultimate MK3”, que não era ruim, mas nõ foi bem compreendido por tentar pegar carona nos combos prolongados de “Killer Instinct” – que era da mesma distribuidora na época, a Midway, mas sofreu forte rejeição pela grande adoração dos mais puristas e fãs de MKII. “MKX”pode sofrer rejeição dos mais puristas, é fato. Mas a seu favor está a sua mecânica, mais bem desenvolvida que apresentada pelo Ultimate em seu tempo. Mortal Kombat X é sobre combos rápidos e lutadores avançados e ofensivos, mas respeita os mais puristas e novatos com opções de estilos mais defensivos, para os amantes de magias e golpes mais friamente calculados. No final da contas, tem espaço para todos.
Ok, e com tudo isso, por que não é melhor que “MK9”? A resposta é mais subjetiva do que prática, mas vamos lá. Para começar, “MK X”é tecnicamente perfeito, mas faltou carisma. O mesmo carisma que fez com que seu antecessor caísse nas graças dos mais novos na série e também dos mais saudosistas. A trilha sonora não é marcante. Suas músicas não remetem a clássicos do passado e também não tem força para se tornarem novos hits da série. São boas, mas não ficam na cabeça e não te empolgam a colocar em seu iPod. Da mesma forma, os cenários são belíssimos e abusam da primazia técnica da nova geração de consoles e GPUs de PCs para oferecer ambientes ricamente retratados, seja na água turva e agitada da fase do pântano, seja na movimentada praça com trabalhadores lapidando as construções e monumentos em adoração a Kotal Kahn. O problema é que faltou vida, faltou carisma. Não ficaram em nossas mentes como a Goro`s Lair ou a The Pit do primeiro jogo, o portal de “MK II” ou a estação metrô de “Mortal Kombat 3”. Servem como ambiente, mas faltou carisma. O mesmo carisma que faltou a Cassie Cage, a filha sem sal e sem açucar de Jonny e Sonya Blade. E também a Kung Jin, o primeiro personagem gay da série que quase passou despecebido, de tão discreta que foi a sua revelação – e só foi confirmada por Twitter por um dos produtores. Tirando esse detalhe, que convenhamos, é importante pelo engajamento da franquia, mas nada relevante para a trama, Kung Jin é mais um detalhe de lutador que passará tão despercebido quanto Allen e Blair da série Street Fighter EX.
Jacqui Cage é o maior exemplo da relação tecnicamente perfeita/falta de carisma. A lutadora tem boas chances de se tornar uma das preferidas do público, sobretudo nos torneios, pois usa a força bruta (uma homenagem a seu pai, o fortão quebra-tudo Jax), mas é bem ágil, algo até raro em lutadores fortões. O problema é que tirando o seu estilo arrebatador nos golpes, a personagem não tem a mesma aura do pai e sua participação – sobretudo a romântica no modo história – é bem monótona. Pra não dizer desnecessária. E por falar no modo história, dessa vez não deu e a Netherrealm não conseguiu atingir a qualidade obtida em “MK9”e “Injustice”. A trama, que tentou unir a história de MK3 e MK4, confundiu mais a cabeça dos jogadores do que explicou e ficou arrastada, sem graça. Fora que a inclusão de personagens como Kotal Kahn e a nova geração de combatentes deixou mais dúvidas em aberto: afinal, qual trama de MK4 é essa que eu não conheço? O roteiro ficou mais para “inspirado” do que “ambientado”nos acontecimentos do quarto jogo. Se a ideia da Netherrealm era a de criar uma nova história incluindo Kotak Kahn, deveriam ter abdicado de Shinok e Quan Chi, que convenhamos, não são os vilões mais temidos da série e, como era de se esperar, nem causam impacto na trama. Notinha bem rápida sobre a dublagem: não está boa, tem falhas de continuidade em alguns trechos, a Pitty se esforçou, mas não é uma dubladora profissional e ponto. Não é algo que eu considere tão importante para gastar muitas linhas e entrando no barulho da massa. Reclamações são válidas, mas ao menos para mim, não é para tanto.
Jogo pra muito tempo Explicações a parte, vamos voltar a falar bem: “MKX” tem muito conteúdo. Se o modo história não empolga, ao menos rende moedinhas para a cripta. Repaginada, a fase de troca de moedas por itens in-game está mais interativa do que as anteriores. Agora, o jogador explora a cripta com mais liberdade de exploração, graças aos cenários diferenciados que incluem cavernas e passagens subterrâneas. Além disso, o jogador ainda sofre alguns sustos, com inimigos que surgem do nada na tela e, caso sejam abatidos, ainda rendem mais moedas para comprar itens. Sobre as recompensas, tem de tudo: roupas secretas, artes conceituais, golpes especiais, entre outros. Outra bela adição são as torres vivas, que funciona como um modo arcade tradicional, mas trazem desafios diferentes e dinâmicos além do básico ‘vença o round’. Por fim, a guerra de facções tem como objetivo acirrar a disputa entre times. Logo ao rodar o jogo pela primeira vez, o jogador escolhe qual time quer fazer parte, por exemplo, o dos guerreiros Lin Kuei. Quanto mais você vencer no jogo, mais pontos ganhará a sua facção nessa luta pela hegemonia.
Nota: 9 [“Mortal Kombat X” é de fato, um belo jogo de luta. O game escorrega apenas pela falta de carisma de alguns lutadores, mas não há o que reclamar da beleza técnica e artística do produto, essas, realmente perfeitas e intocáveis. As lutas estão dinâmicas, robustas e divertidas, o que, no final das contas, é o que vale para um jogo de luta. Além disso, temos de tirar o chapéu para os gráficos incríveis e pela ousadia da Netherrealm em abrir mão de conceitos sexistas ultrapassados tão explorados nos jogos de luta e oferecer o projeto mais sério e maduro da série até hoje, em todos os sentidos. Por quê não, esse pode ser o começo de um amadurecimento na indústria de games. Isso sempre deverá ser enaltecido.]
Não supera antecessor? Me perdoe mas você não entende de jogos de
luta. Qualquer jogador que entenda o básico do básico consegue enxergar a superioridade técnica deste jogo em relação ao MK9
Me perdoe, mas você não entende nada de ler reviews ou simplesmente não entendeu o que eu escrevi. =) Eu disse que Mortal Kombat X evoluiu e, aliás, é tecnicamente perfeito. Tá lá no texto. Sobre não superar o antecessor, ainda comentei que a minha resposta é subjetiva e, ao meu ver, faltou carisma aos novos lutadores. Logo, eu nunca disse que no aspecto técnico o Mortal Kombat X seja pior que o antecessor, do contrário, ambos concordamos que ele é superior. Só faltou o carisma dos lutadores e uma história tão bem amarrada quanto a de MK9.